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Juiz determina que presidente da Câmara de Marizópolis receba requerimento que pede anulação da eleição da mesa diretora.

Por Francisco Marcos Pereira em 10/06/2021 às 19:41:18
Foto/Câmara de Marizopolis

Foto/Câmara de Marizopolis

Os vereadores Allan Wagner, Diego Jerônimo, Francisco Alexandre, Manoel JĂșnior, e Carlos José, representados pelo advogado Francisco Abrantes, entraram com uma ação de Mandato de Segurança CĂ­vel, contra VinĂ­cius Nito, presidente da Câmara Municipal de Marizópolis, alegando que o mesmo se negou a receber um requerimento que pede a anulação da eleição da Mesa Diretora daquela casa legislativa.

Requerendo a tĂ­tulo de tutela antecipada, que o impetrado seja compelido/obrigado a receber, protocolar e despachar o requerimento relativo à anulação da eleição da mesa diretora da Câmara Municipal da referida cidade para biĂȘnio 2021/2022, para que o pleito seja posto à apreciação da Casa Legislativa, assim como determina o art. 95, parĂĄgrafo Ășnico do Regimento Interno da Câmara Municipal de Marizópolis.

Nesta quinta-feira, 10 de junho, o Juiz AgĂ­lio Tomaz Marques da 4ÂȘ Vara Mista da Comarca de Sousa, concedeu a Tutela de UrgĂȘncia e determinou que o presidente da Câmara de Marizópolis, VinĂ­cius Nito, receba no prazo de 05 (cinco dias o requerimento que pede a anulação da eleição da mesa diretora para o biĂȘnio 2021/2022.

Os vereadores que entraram com a ação, argumentam que o presidente VinĂ­cius Nito estĂĄ se recusando a receber um requerimento assinado por 5 (cinco), dos 9 (nove) vereadores da Câmara Municipal de Marizópolis, incorrendo, por isso, em abuso de poder, caracterizando, inclusive, ato de improbidade administrativa (art. 11, II, da Lei n.Âș 8.429/1992) e crime de prevaricação (art. 319 do Código Penal), além de violar os princĂ­pios da legalidade, impessoalidade, moralidade, honestidade, imparcialidade e lealdade, aplicĂĄveis à Administração PĂșblica Direta e Indireta de todos os entes e poderes, notadamente por deixar de praticar, indevidamente, ato de ofĂ­cio. Na data de 28 de maio de 2021, o Presidente VinĂ­cius Nito para a surpresa de todos editou o Decreto nÂș 002/2021 suspendendo todas as sessões presenciais, virtuais e inclusive o expediente interno, deixando a câmara sem qualquer funcionamento mĂ­nimo, que tenta obstar sua atuação parlamentar praticando atos atentatórios ao Regimento Interno da Casa.

VEJA A DECISÃO DO JUIZ:

É o que basta relatar. DECIDO.

Conforme relatado, antes do exame do pedido a Câmara Municipal de Marizópolis compareceu espontaneamente aos autos e, em sĂ­ntese, impugnou o valor da causa e alegou litispendĂȘncia com o processo nÂș 0800025-08.2021.815.0371.

Quanto à impugnação ao valor da causa, alega a autoridade coatora que o valor atribuĂ­do pelo impetrante à presente causa foi equivocado, jĂĄ que deveria corresponder ao conteĂșdo econômico almejado e, como o impetrante busca anular a eleição seria o valor correto a ser atribuĂ­do ao presente mandamus seria o correspondente ao salĂĄrio do vereador durante 24 meses.

A referida impugnação hĂĄ de ser rejeitada, isso porque o pedido em cotejo nestes autos cinge-se a que o requerimento formulado pelos impetrantes seja recebido pelo impetrado observando o Regimento da Casa, não constando nos autos pedido de anulação das eleições, como dito nas razões de impugnação, desse modo, vislumbro que a demanda veicula discussão, exclusivamente, sobre a ilegalidade ou abuso de poder, dentro do procedimento de recebimento dos requerimentos na Câmara, de fato, não havendo vantagem econômica perquirida por meio da impetração do writ, o que permite o valor da causa por estimativa.

No que concerne a alegada litispendĂȘncia, igualmente a rejeito, haja vista que não se verifica identidade de pedidos desta ação, que, como dito, visa o recebimento e tramitação de requerimento formulado perante à Câmara de Vereadores de Marizópolis, enquanto que o processo nÂș 0800025-08.2021.815.0371, tem como objeto a anulação da eleição da mesa diretora daquela Casa Legislativa em razão da participação, na referida votação, de vereador que se encontrava preso.

Analisadas e rejeitadas as questões preliminares, passo a anĂĄlise do pedido de tutela antecipada.

Como cediço, a concessão de tutela antecipada pressupõe a concomitante verificação dos requisitos da plausibilidade do direito invocado e do perigo de dano ou o risco do resultado Ăștil do processo, consoante art. 300 do Código de Processo Civil. Em matéria de tutelas de urgĂȘncia contra a Fazenda PĂșblica, mister se faz o atendimento às vedações legais expressas na Lei nÂș 8437/92, na Lei nÂș 9494/97 e na Lei nÂș 12.016/2009, as quais, em resumo, impedem a concessão de tutelas antecipadas quando "esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação", quando tenha por objeto a concessão de créditos tributĂĄrios, a entrega de mercadoria e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores pĂșblicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.

Ademais, importa mencionar também, que, consoante artigo 5Âș, inciso LXIX, da Constituição da RepĂșblica, e o artigo 1Âș da Lei de Mandado de Segurança (Lei nÂș 12.016/09), concede-se mandado de segurança para proteger direito lĂ­quido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente, ou com abuso de poder, alguém estiver sofrendo violação ou houver justo receio de sofrĂȘ-la, por parte de autoridade.

No caso vertente, a ação mandamental foi impetrada por vereadores do MunicĂ­pio de Marizópolis, em face do Presidente da Câmara Municipal, objetivando a que a apontada autoridade coatora fosse compelida a proceder ao recebimento de requerimento de anulação de eleição da mesa diretora.

Segundo informaram os impetrantes, o requerimento foi subscrito por 5 (cinco) vereadores, ora impetrantes, sendo, portanto, assinado por maioria absoluta dos vereadores da Câmara (cinco dos nove). No entanto, os funcionĂĄrios da Casa Legislativa, após conversa por telefone com o Presidente da Câmara, ora impetrado, se recusaram a receber o requerimento. Toda essa situação foi gravada dentro do prédio da Câmara.

Seguem afirmando que o Vice-Presidente da Câmara, e também autor do requerimento, DIEGO JERONIMO DA SILVA, no dia 27 de maio de 2021, enviou mensagens via WhatsApp ao Presidente VINÍCIUS NITO (83 9 8107-0809), exigindo o recebimento do requerimento, bem como cópia do Requerimento n.Âș 001/2021. O impetrado, embora tenha visualizado a mensagem, não retornou. No mesmo dia (27/05/2021), o Vice-Presidente da Câmara enviou o requerimento via e-mail para a Câmara, sem também obter resposta, violando, portanto, o disposto no art. 95 do Regimento Interno daquela Casa Legislativa.

Pois bem.

Antes de partir para o exame do caso concreto, mister algumas considerações iniciais, acerca da natureza do fato omissivo impugnado e da abrangĂȘncia do controle jurisdicional na espécie.

Numa primeira anĂĄlise, verifico que a questão ora posta à apreciação judicial diz respeito tão somente à aplicação das normas previstas no Regimento Interno da Casa Legislativa, tal como consta na fundamentação exposta na petição inicial.

E, como consequĂȘncia do preceito constitucional da separação e independĂȘncia de Poderes (art. 2Âș, CF-88), a princĂ­pio não deve o Poder JudiciĂĄrio imiscuir-se em questão exclusivamente interna corporis dos órgãos legislativos, caracterizados por um conflito de interesses fundado na interpretação ou na aplicação de normas regimentais.

É prudente relembrar que a questão da intervenção do Poder JudiciĂĄrio no exame das questões de natureza estritamente polĂ­tica, desde o julgamento do Habeas Corpus nÂș 300, ainda no ano de 1891, tem suscitado sucessivos questionamentos.

Com efeito, se neste julgamento o Supremo Tribunal Federal entendeu que não caberia imiscuir-se em questões polĂ­ticas do Poder Executivo ou Legislativo, jĂĄ no julgamento do Habeas Corpus n° 1.063 de 1898, "suavizou" o seu entendimento no sentido de que a intervenção judiciĂĄria seria admitida quando em jogo a proteção de liberdades individuais.

De outro modo, se nas Constituições de 1934 (art. 68) e de 1937 (art. 94) se previa que era "vedado ao Poder JudiciĂĄrio conhecer de questões exclusivamente polĂ­ticas", na Constituição democrĂĄtica de 1946 (art. 141, §4Âș), com preceito reproduzido no atual art. 5Âș, XXV da Constituição Federal de 1988, se tem garantido o amplo acesso à justiça, prescrevendo que "A lei não poderĂĄ excluir da apreciação do Poder JudiciĂĄrio qualquer lesão de direito individual".

Assim, a interpretação sistemĂĄtica dos arts. 2Âș e 5Âș, XXV da Constituição Federal de 1988, deve conduzir ao raciocĂ­nio de que os casos reconhecidamente "interna corporis" apenas podem ser objeto de apreciação do Poder JudiciĂĄrio, quando visarem à proteção de um direito fundamental alegadamente afetado.

Sobre o tema, valiosa é a lição de Alexandre de Moraes, In: Direito Constitucional, Ed. 16, Editora Atlas, p. 618: (...) o flagrante desrespeito às normas regimentais, durante o processo legislativo, caracteriza clara ilegalidade, uma vez que os regimentos internos das Casas legislativas - são resoluções, ou seja, espécies normativas primĂĄrias previstas diretamente na Constituição Federal (CF, art. 59, inc. VII). Entendemos que essa ilegalidade também serĂĄ passĂ­vel de controle jurisdicional, com base no art. 5Âș, inc. XXV, da Carta Magna, pois a apreciação de lesão ou

ameaça a direito jamais poderĂĄ ser afastada do Poder JudiciĂĄrio. Dessa forma, os parlamentares são possuidores de legĂ­timo interesse para o ajuizamento de mandado de segurança em defesa de direito lĂ­quido e certo de somente participarem de um processo legislativo constitucional e legal, em conformidade com as normas da Constituição

Federal e das resoluções, instrumentos formais que trazem os regimentos internos, não sendo, portanto, obrigados à participação e votação de um processo legislativo viciado, quer pela inconstitucionalidade, quer pela flagrante ilegalidade.

Este, parece-me, tem sido o entendimento atualmente vigente no âmbito do Supremo Tribunal Federal, conforme se pode extrair dos precedentes:

Agravo regimental. Mandado de segurança. Questão interna corporis. Atos do Poder Legislativo. Controle judicial Precedente da Suprema Corte. 1. A sistemĂĄtica interna dos procedimentos da PresidĂȘncia da Câmara dos Deputados para processar os recursos dirigidos ao PlenĂĄrio daquela Casa não é passĂ­vel de questionamento perante o Poder JudiciĂĄrio, inexistente qualquer violação da disciplina constitucional. 2. Agravo regimental desprovido. (MS 25588 AgR, Relator(a): Min. MENEZES DIREITO, Tribunal Pleno, julgado em 02/04/2009, DJe-084 DIVULG 07-05-2009 PUBLIC 08-05-2009 EMENT VOL-02359-02 PP-00350 RTJ VOL-00210-01 PP-00241 RT v. 98, n. 886, 2009, p. 135-139) [...] O CONTROLE JURISDICIONAL DOS ATOS PARLAMENTARES: POSSIBILIDADE, DESDE QUE HAJA ALEGAÇÃO DE DESRESPEITO A DIREITOS E/OU GARANTIAS DE ÍNDOLE CONSTITUCIONAL. - O Poder JudiciĂĄrio, quando intervém para assegurar as franquias constitucionais e para garantir a integridade e a supremacia da Constituição, desempenha, de maneira plenamente legĂ­tima, as atribuições que lhe conferiu a própria Carta da RepĂșblica, ainda que essa atuação institucional se projete na esfera orgânica do Poder Legislativo. - Não obstante o carĂĄter polĂ­tico dos atos parlamentares, revela-se legĂ­tima a intervenção jurisdicional, sempre que os corpos legislativos ultrapassem os limites delineados pela Constituição ou exerçam as suas atribuições institucionais com ofensa a direitos pĂșblicos subjetivos impregnados de qualificação constitucional e titularizados, ou não, por membros do Congresso Nacional. Questões polĂ­ticas. Doutrina. Precedentes. - A ocorrĂȘncia de desvios jurĂ­dico-constitucionais nos quais incida uma Comissão Parlamentar de Inquérito justifica, plenamente, o exercĂ­cio, pelo JudiciĂĄrio, da atividade de controle jurisdicional sobre eventuais abusos legislativos (RTJ 173/805-810, 806), sem que isso caracterize situação de ilegĂ­tima interferĂȘncia na esfera orgânica de outro Poder da RepĂșblica. [...] (MS 24849, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 22/06/2005, DJ 29-09-2006 PP-00035 EMENT VOL-02249-08 PP-01323)

Dito isto e diante da disposição constante no art. 95 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Marizópolis de que "serão verbais ou escritos e imediatamente despachados pelo Presidente os requerimentos que solicitem (...)", conforme dito pelos impetrantes e, ainda que indiretamente confirmado pela autoridade coatora quando na sua manifestação informa que "no dia 27 de maio, quando por duas vezes o vereador Diego se dirigiu a Câmara Municipal, para, segundo ele, protocolar o indigitado requerimento, o vereador presidente e, em razão do conteĂșdo da peça – que não é comum, reservou para si o direito de recebe-lo", compulsando o Regimento Interno da Câmara de Vereadores de Marizópolis, no tĂ­tulo dos requerimentos, verifico que o dispositivo legal é claro no sentido de que apenas o Presidente pode despachĂĄ-lo, mas não hĂĄ restrição que indique que o recebimento tem que ser pelo mesmo, de modo que, em cognição sumĂĄria e atendo-me unicamente a questão do protocolo/recebimento do requerimento, reputo que, se não impedimento, algum óbice ao protocolo do requerimento foi gerado no caso vertente. Noutro norte, impõe-se observar o que dispõe a Constituição Federal, em seu artigo 5Âș: XXXIII - todos tĂȘm direito a receber dos órgãos pĂșblicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindĂ­vel à segurança da sociedade e do Estado; XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:

a) o direito de petição aos Poderes PĂșblicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;

Da leitura dos dispositivos constitucionais, denota-se que é assegurado a qualquer cidadão, formular requerimentos administrativamente, salvo hipótese de sigilo, sendo a questão de segurança nacional.

Se o direito de petição é assegurado constitucionalmente a qualquer cidadão, com muito mais razão deve ser observado, quando o pedido é requerido por vereador, incumbido legalmente da função legislativa.

Portanto, cingindo-me unicamente a questão do protocolo/recebimento do requerimento, vislumbro patente a ilegalidade do ato praticado pelo impetrado, que não observou os ditames do Regime Interno da Câmara Municipal de Marizópolis, norma que rege o processo legislativo em âmbito local, cuja inobservância é passĂ­vel de controle pelo Poder JudiciĂĄrio, assim como o direito de petição, assegurado constitucionalmente.

Outrossim, o perigo na demora do provimento jurisdicional se justifica ante a necessidade de se garantir que os debates na Casa Legislativa não sejam minimizados, e, sobretudo, o direito de oposição, especialmente aquele reconhecido às minorias legislativas, que para não ser transformado numa promessa constitucional inconsequente, hĂĄ de ser aparelhado com instrumentos de atuação que viabilizem a sua prĂĄtica efetiva e concreta.

Desta forma, CONCEDO A TUTELA ANTECIPADA pretendida unicamente para determinar ao Presidente da Câmara de Vereadores de Marizópolis que, no prazo de 05 (cinco) dias Ășteis, efetue o recebimento do requerimento formulado pelos impetrantes, objeto desta demanda.

Intimem-se.

Notifique-se a autoridade coatora para, no prazo legal, apresentar as informações.

Intime-se o representante legal da autoridade, para os efeitos da Lei nÂș 12016/2009.

Após, ao Ministério PĂșblico, para os fins do art.12, da Lei nÂș 12016/2009.

Transcorrido o prazo, ou sem manifestação, venham-me os autos conclusos para sentença.

Cumpra-se com os expedientes necessĂĄrios.

Nos termos do ART. 102 DO CÓDIGO DE NORMAS JUDICIAL, da Douta Corregedoria de Justiça da ParaĂ­ba, confiro a esta decisão força de mandado/ofĂ­cio para as procedĂȘncias necessĂĄrias ao seu fiel cumprimento.

Sousa/PB, data do protocolo eletrônico.

AGÍLIO TOMAZ MARQUES

Juiz de Direito

Fonte: Da Redação do Portal Nordeste

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